Encontrei este poema de Éluard na última viagem a Paris (os regressos a Paris são sempre o regresso a uma casa perdida, mas à qual podemos voltar, por momentos, quando mais precisamos dela), no topo de uma enorme prateleira de uma livraria em Abbesses - uma livraria em que as paredes são livros e outros recantos se cobrem com postais e cartazes para a nossa imaginação. A esse topo subia-se por um escadote de poucos metros de altura, obrigando-nos a pautar cada gesto nosso pela calma e pela atenção, como se, nesse topo, o tempo já fosse diferente, apenas o das palavras. Ou como me recordo numa outra livraria, do outro lado do mundo, que anunciava aos seus visitantes antes de entrarem nas suas salas: abandon all despair ye who enter here. A poesia lá se encontrava, e aí, sem outros clientes ao nosso lado, nesse lugar mais perto do céu, lemos sozinhos palavras que só podem ser nossas. E ao descer de novo desse escadote, trazemos essas palavras connosco até à terra, sabendo que não as basta ler, terá de se fazer qualquer coisa delas. No fim da mesma rua, chega-se ao cemitério de Montmartre, onde os mortos vivem por aquilo que nos deixaram, e sobre a campa de Truffaut, alguém vivo e que respira, entre nós, as nossas sensações e as nossas dúvidas, escreveu a maior das certezas: "you were always right".